O Último Suspiro no Apartamento 32

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Crédito: Freepik

Quem já passeou na Praia Grande de noite, numa quarta-feira? Eu já e posso confirmar: as ruas são escuras apesar do luar, que bate seco nas calçadas. E o silêncio? Chega a ser quase ensurdecedor.

Dona Claudia, empresária facilmente sugestionável, voltava do trabalho com o marido, caminhando tranquilamente. De repente, ela estaca e seus olhos se arregalam:

— Querido, chama a polícia! — gritou, apontando para um terraço do prédio.

Dona Claudia era fã de séries, e já se via dentro do primeiro episódio de “CSI: Litoral Paulista”!

Com o berro, o pessoal do bareco da esquina saiu com os copos à mão, tentando enxergar algo no meio de suas vistas já turvas.

Quem conseguiu, viu algo avassalador! Um corpo, pendurado no terraço, cabeça para baixo, braços largados, pernas abertas, roupas sociais rasgadas, um só pé enroscado no gradil externo.

O pânico se alastrou como um vírus. Desceram a rua temerosos, olhar fixo na figura assustadora.

Minutos depois chega a Guarda Civil Municipal, muito profissional, afastou o grupo da cena de delito. Interfonaram ao zelador, que abriu o portão e informou que no 32 morava um homem solteiro e educado. Subiram ao apartamento.

  • Sr Mário, aqui a GCM, abra por favor.

Os policiais entraram com armas em punho, rumo ao terraço, enquanto o zelador explicava a situação a Mário, que tentou gracejar sem sucesso:

  • É só uma decoração… sexta feira é Halloween! Fiz com minhas roupas velhas e garrafas PET… reciclagem com susto…

— Amigo, pode tirar isso? Temos uma escola aqui do lado; você não vai querer que uma criança vire fã de filmes de terror antes da hora… – ordena o policial, agora com rosto visivelmente descontraído.

O boneco foi recolhido, o grupinho na rua, agora mais calmo, soltou um suspiro de alívio.

No dia seguinte, as conversas voltaram aos bares: humor nervoso, acusações veladas sobre excessos culturais e discussões sobre os limites da liberdade de assustar. Alguns riam da própria imaginação; outros, orgulhosos de ter feito parte de um alarme coletivo que lembrara a todos a tênue linha entre o Real e a Ficção.

E o boneco, no escuro de um armário, tornou-se memória de um dia em que uma brincadeira quase se transformou em tragédia pública.

Sandra VR Lugli é escritora e autora do livro Uma tênue linha…entre Ilusão e Realidade.

Na editoria Realidade em Prosa, você confere contos ficcionais inspirados em notícias reais.


SUGESTÕES DE PAUTA: reportagem@gruposulnews.com.br 

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