Saúde masculina: a importância de uma cultura preventiva durante e pós-pandemia

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O contágio do novo coronavírus não só impactou a rotina do mundo todo, como afetou intensamente a atividade médica. Parte expressiva dos profissionais de saúde passou a dedicar-se exclusivamente à atenção dos pacientes infectados. Unidades hospitalares tiveram que adaptar seus ambulatórios e enfermarias para atender aos acometidos pela doença. Estas mudanças diminuíram de forma drástica a capacidade da rede de saúde em prestar atendimento às pessoas portadoras de outras patologias que tiveram postergadas suas consultas, tratamentos e cirurgias.

No Brasil, houve uma queda de 70% nas cirurgias oncológicas e uma redução de até 90% das biópsias enviadas para análise. Estima-se que ao menos 50 mil brasileiros deixaram de receber diagnóstico de câncer nos dois primeiros meses de pandemia, ou seja, entre março e maio deste ano, de acordo com dados levantados pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO) e Sociedade Brasileira de Patologia (SBP) junto aos principais serviços de referência do país, nas redes pública e privada.

Outro dado, o do ICESP – Instituto do Câncer do Estado de São Paulo – estimou uma redução de 50% no número de diagnósticos de câncer no País e que, só no mês de abril, 70% das cirurgias para tumores malignos foram adiadas naquela instituição. Acrescente-se a esse quadro a insegurança da população que evitou procurar os serviços de saúde por medo da exposição a ambientes potencialmente contaminados e a um maior risco de infecção pelo coronavírus.

Esta situação acabou resultando no retardamento do diagnóstico de doenças cujo sucesso do tratamento depende muito de uma identificação precoce do problema, principalmente as neoplasias malignas. 

Já o INCA – Instituto Nacional do Câncer – estima que, em 2020, ocorram no Brasil cerca de 65.840 casos novos de câncer de próstata. Esse valor corresponde a um risco estimado de aproximadamente 63 casos novos a cada 100 mil homens. Utilizando-se os dados do ICESP referentes à redução da detecção de câncer neste período, é provável que mais de 30.000 homens deixaram de ter o diagnóstico de câncer de próstata neste período.

É preocupante para uma patologia cuja cura está diretamente ligada à sua identificação precoce. O câncer de próstata é o segundo tumor maligno mais comum entre os homens, perdendo somente para o câncer de pele não melanoma. É a segunda maior causa de óbito oncológico no sexo masculino, sendo o sexto tipo de câncer mais freqüente no mundo. Estima-se que, quase 25% dos portadores de câncer de próstata, morrem devido à doença.

Infelizmente, cerca de 20% dos pacientes portadores da neoplasia ainda são diagnosticados em estágios avançados quando não há mais chances de cura.  Diversos estudos têm demonstrado que os homens são os mais vulneráveis às enfermidades do que as mulheres, especialmente as doenças crônicas e graves, e por esta razão morrem mais cedo. A cultura patriarcal, vigente na nossa sociedade, estimula um comportamento até irresponsável dos homens que resistem em cuidar da saúde com a convicção que são imunes e resistentes a quaisquer doenças.

A falta de uma cultura preventiva que valorize o autocuidado, o medo da descoberta de uma doença e a possibilidade de ter que se submeter a um tratamento, bem como a vergonha em realizar procedimentos clínicos e de se expor a um profissional da saúde são alguns elementos que tornam os homens mais resistentes a procurarem atendimento médico.

Um estudo realizado no Centro de Referência da Saúde do Homem, órgão da Secretaria de Saúde de São Paulo, mostrou que 60% do total de pacientes recebidos naquela unidade já apresentavam doenças em fase avançada e necessitavam de atendimento de maior complexidade.

Neste momento em que ainda temos motivos para nos preocupar com a pandemia, devemos, mais do que nunca, aproveitar o Novembro Azul para incentivar os homens a vencer a barreira do preconceito. E é importante que os médicos entendam que a avaliação periódica da próstata não se encerra em si mesma, mas também representa uma oportunidade única para que os homens sejam investigados, orientados e tratados de outros problemas que possam estar comprometendo sua saúde. 


DR. GERALDO FARIA é presidente da Sociedade Brasileira de Urologia — regional São Paulo membro da Associação Americana de Urologia e da Associação Europeia de Urologia

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