Em 2021, no auge da pandemia de Covid-19, algumas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) das regiões de Santo Amaro e Cidade Ademar, na zona sul de São Paulo, implantaram um projeto que unia a possibilidade de interação ao ar livre com a promoção da saúde física e mental, por meio do cultivo de hortas medicinais e alimentares nos próprios equipamentos de saúde e também em escolas da região.
“Farmácias Vivas & Segurança Alimentar” é o nome do projeto, amparado implementado na Supervisão Técnica em Saúde (STS) de Santo Amaro e Cidade Ademar, por meio de uma parceria da Secretaria Municipal da Saúde (SMS) com o Instituto Nacional de Tecnologia em Saúde (INTS).
O equipamento que serviu de embrião ao projeto foi o Centro de Atenção Psicossocial (Caps) Adulto de Cidade Ademar; na época, a proposta era disponibilizar um espaço para hortoterapia, que depois ampliou-se em hortas de plantas medicinais, hoje presentes em duas UBSs, e alimentares, em seis locais, entre equipamentos de saúde e escolas. O objetivo, para 2023, é expandir esta rede.
Cada horta criada envolve uma equipe multidisciplinar, com profissionais de farmácia, nutrição e também Agentes de Promoção Ambiental (APAs) ligados ao Programa Ambientes Verdes e Saudáveis (Pavs) e à Estratégia Saúde da Família (ESF). Nas hortas terapêuticas são plantadas ervas medicinais como melissa, hortelã, citronela, lavanda, gengibre, capim santo, boldo, sálvia e muitas outras, usadas para fazer chás. O preparo destes chás, por sua vez, é pretexto para encontros de grupos vinculados às UBSs.
A farmacêutica Patrícia Miyashiro coordena um grupo de chá na UBS Jardim Miriam II, em Cidade Ademar. A unidade é uma das que contam com a horta terapêutica, criada em 2021 em um pequeno espaço na área externa, junto à academia ao ar livre da UBS. Ali, os APAs prepararam canteiros, vários deles suspensos por conta do espaço exíguo, e começaram o plantio. Hoje são cerca de 20 espécies de plantas medicinais, e ervas, que a cada 15 dias, quando o grupo se reúne, são transformadas em aromáticas infusões e saboreadas pelos participantes, cerca de 12 pessoas com idades entre 65 e 92 anos.
Se cabe ao Pavs preparar as hortas e transmitir informações sobre as plantas medicinais, orientar sobre seus usos e preparos é tarefa para outro programa previsto pelo SUS e que funciona em muitos dos equipamentos municipais de saúde: as Práticas Integrativas e Complementares (PICs). Esta é a função de Patrícia, como farmacêutica. “O grupo de chá é formado por pessoas, em sua maioria mulheres, muito carentes, e esta possibilidade de interação e mesmo de troca de saberes tradicionais significa muito para elas”, comenta a profissional, que vê a horta e o chá não apenas em seu potencial fitoterápico, mas também de promoção da saúde integral, incluindo a saúde mental, característica que é compartilhada por muitas das PICs.
As hortas alimentares, por sua vez, estão principalmente nas escolas da região, e também envolvem os APAs, que preparam sua estrutura nas áreas disponíveis em cada local, além de nutricionistas, responsáveis pelas informações sobre o uso e preparo de cada planta – e são muitas. Almeirão, alface, rúcula, agrião, couve, além de plantas alimentícias não convencionais (Pancs) como peixinho, ora-pro-nobis, taioba e capuchinha. Elas entraram no cardápio das escolas e também fazem sucesso. “Os diretores relatam que as crianças não apenas mudaram seus hábitos alimentares, mas também influenciaram mudanças em suas famílias”, comenta a supervisora de responsabilidade socioambiental do INTS, Paula Cruciak Arnold.
Tantos as hortas terapêuticas quanto alimentares do Farmácias Vivas & Segurança Alimentar são abastecidas por um viveiro de mudas, localizado no mesmo Caps de Cidade Ademar que deu origem ao projeto. Ali, os pacientes atendidos pelo equipamento ajudam os APAs no constante trabalho de produzir sementes e mudas, que depois irão para as unidades que integram a iniciativa.
O uso de plantas medicinais e fitoterápicos no sistema único de saúde (SUS) foi consolidado em 2006 com a publicação da Portaria nº 971 e do Decreto nº 5.813, que regulamentam a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PICs) e a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos. Esta se refere à implantação de hortas comunitárias e medicinais em UBSs e introduz o uso de fitoterápicos e plantas medicinais na atenção primária à saúde do SUS.
Já o conceito de Farmácia Viva dentro do SUS foi instituído em 2010, com a Portaria nº 886 do Ministério da Saúde, que prevê um espaço privilegiado para as plantas medicinais dentro dos equipamentos de saúde, abrangendo o cultivo de plantas medicinais, coleta, processamento, armazenamento, manipulação e dispensação de preparações de plantas medicinais e produtos fitoterápicos.
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