Mina de ouro colapsa e deixa ao menos 14 mortos na Venezuela

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Crédito: Freepik

O ouro sempre falou mais alto em El Callao, gritando por fortuna sem se preocupar em conhecer os nomes daqueles que o escavavam. Naquela manhã, a chuva decidiu não ceder, uma chuva fortíssima, primeiro um aviso e depois, escancarada, a escuridão e o silêncio total.

Entre o grito de fortuna do ouro e os gritos de socorro dos homens que escavam para encontrá-lo, fala mais alto o ouro. E naquela manhã, em El Callao, não foi diferente.

Os garimpeiros fizeram o que podiam para chamar a atenção dos que estavam na superfície. Mas o céu mostrou-se arrogante, a água invadiu os poços e a terra cedeu. A mina, uma garganta antiga e ilegal, implodiu rapidamente ao peso da ganância humana.

Não tardaram em acudir, primeiro os habitantes, depois as ambulâncias e os bombeiros. Organizaram postos de ajuda, para dar apoio ao desespero humano. A coleta de palavras de consolo parecia insuficiente; as mãos, porém, continuavam a buscar, a escavar, a soprar poeira das lembranças.

A lama continuava trazendo sapatos, fotos, esperanças que rapidamente se esgotavam. Encontraram catorze corpos, espremidos entre cascalho e água. Abaixo disso tudo, o ouro continuou imóvel, indiferente ao luto que fazia fila no chão da praça. A cidade colocou velas nas esquinas e, em cada vela, um nome que não cabia mais na boca dos que restaram.

Na igreja, as vozes se misturavam a promessas rompidas; uma mãe abraçava roupas achadas no meio da lama, na esperança de que, por mágica ou milagre, dentro da roupa, tomassem vida as formas tão amadas daquele seu filho. À noite, diante do poço selado, as famílias deixaram objetos que pesavam tanto quanto o metal: retratos, roupas, cartas de despedida.

Quando os esforços cessaram, restou o trabalho pesado de nomear a dor e de enterrar o que não se pode negociar. O ouro continuou a ser ouro, inalterado e indiferente. A morte continuou a ser morte, implacável em seu trajeto. Entre os dois, a cidade, que vivera pendurada ao brilho fácil, aprendeu a pesar não o ouro, mas as ausências.

Por Sandra VR Lugli é escritora e autora do livro Uma Tênue Linha

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SUGESTÕES DE PAUTA: reportagem@gruposulnews.com.br 

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