Especialista em infância explica por que o recesso escolar é fundamental para o desenvolvimento cognitivo e emocional das crianças
O período de férias costuma acionar, em muitas famílias, a preocupação com como “ocupar” as crianças. Para o pedagogo e escritor David Santos, a lógica deveria ser outra. Ele defende que a pausa, o tempo livre e o brincar espontâneo formam um ambiente privilegiado para a aprendizagem, sobretudo por estimular a imaginação e a capacidade de abstração — dois pilares do desenvolvimento infantil.
Segundo David, a infância não depende de tarefas formais para aprender. “A infância aprende enquanto respira. A pausa não desliga a criança do mundo; ela abre espaço para que ela o compreenda”, afirma. Ele explica que o brincar livre aciona mecanismos cognitivos que não se manifestam da mesma forma em atividades estruturadas. “Quando a criança transforma um cabo de vassoura em espada, uma caixa em castelo ou o sofá em montanha, ela ativa a capacidade de abstração. Isso é pensamento simbólico em seu estado mais genuíno.”
Em um cotidiano marcado por excesso de telas, pressão por produtividade e agendas sobrecarregadas, o período de férias se torna — segundo ele — uma oportunidade de restaurar experiências essenciais ao desenvolvimento. “A abstração é a base da leitura, da escrita, da criatividade e da solução de problemas. Uma criança que brinca bem, pensa bem. E uma criança que pensa bem, aprende com mais profundidade.”
A neurociência oferece sustentação a essa ideia. Pesquisas apontam que o jogo simbólico e o ócio criativo ativam funções executivas, ampliam repertório linguístico e fortalecem redes emocionais que impactam diretamente a aprendizagem. Para David, isso indica que parte do que será vivido na escola depende do que se experimenta fora dela. “Férias não são tempo perdido. São tempo fértil. São um espaço para organizar pensamentos, criar narrativas internas e construir autonomia.”
Ele também destaca que o adulto não precisa transformar as férias em um calendário de atividades. “Às vezes, tudo o que a criança precisa é de tempo, chão e liberdade. O adulto não precisa dirigir a brincadeira; precisa garantir que ela aconteça”, afirma.
Para o pedagogo, o fim do ano abre uma chance de recuperar sensações que compõem a experiência da infância: vínculos, histórias inventadas, ritmos mais lentos e o prazer de existir sem pressa. “A pausa nos lembra que a infância não é preparação para nada. Ela é vida acontecendo agora. E brincar é o idioma dessa vida”, finaliza.
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